quinta-feira, 2 de abril de 2020

Máquina do tempo

Existem momentos que eu gostaria muito de poder esquecer, como se eles nunca tivessem acontecido, pena que querer não é poder. Me pergunto quando a morte voltou a parecer tão convidativa, talvez tenha sido no final desse mês de março. Eu sinto um aperto dentro do peito, um peso, será que há alguma forma de fazer isso ir embora? Sinto uma vontade intensa de chorar, mas as lágrimas não caem, está tudo reprimido aqui dentro. Eu criei paredes e me fechei, dentro da minha própria fortaleza, sozinha, impenetrável. Ninguém mais pode me salvar agora, e descobri isso da pior forma. Se eu apenas tivesse a força necessária, para pressionar a lâmina gelada contra a minha pele mais uma vez. Mas meus pulsos parecem feitos de borracha, como se não tivessem ossos dentro deles. Isso até soa familiar, como todo o vazio que um dia já senti. Mas o que pode ser pior do que o vazio? Sentir ódio, talvez. Um ódio tão grande de si mesma, que faz com que você não consiga se suportar mais, você só precisa pôr um fim nisso. Como alguém poderia amar algo tão quebrado? Tão dilacerado? Já não me reconheço no espelho, não gosto do reflexo que vejo. Será que algum dia sequer gostei dessa figura espelhada? Mas eu sigo vivendo, pois pior do que morrer é ter que continuar viva, e eu mereço isso, essa eterna condenação. Cante para mim enquanto durmo, talvez eu feche meus olhos e nunca mais acorde de tanto desgosto, quem me dera. A depressão é um fantasma silencioso, que vai e volta quando você menos espera, mas nunca vai embora de verdade. Por trás de toda a agressividade está um clamor por não ser digna, não merecer qualquer espécie de amor ou compaixão. Você é só lixo, apodrecendo lentamente. A dissociação te ajuda a acreditar que as coisas não são bem assim, você pode fingir estar em outro lugar, ser outra pessoa, sonhar e fazer isso parar. E a anorexia te diz que não, você não pode comer aquilo, você já está gorda demais e não gosta do que vê no espelho. E a ansiedade é a cartada final, apenas a espreita, aguardando o momento mais propício. Estou cansada de me sentir assim, mas como posso sequer pensar em sentir qualquer outra coisa, quando isso é tudo que conheço? Eu sei que você merece coisa melhor, e que estaria bem melhor sem mim, então porque não consigo te deixar ir? Se eu pudesse voltaria no tempo, e te livraria do empecilho de me conhecer, livraria qualquer um desse fardo, é uma pena que máquinas do tempo não existem.

4 comentários:

  1. senti conforto ao ler esse texto, é como se fosse um espelho

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  2. Quem poderia amar algo...alguém tão quebrado? Talvez alguém que viu que esse "quebrado" "tinha" jeito.Será que ainda tem? Torço pra tudo estar e ficar bem.

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    1. Acho que todos, no fundo, continuamos tendo alguma esperança de que tenha jeito né? O triste é quando não vemos mais nenhuma luz no fim do túnel.

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